quinta-feira, 24 de janeiro de 2013


“Queria ser de novo menina, meio selvagem, atrevida e livre!
Rindo quando me ofendiam, em vez de ficar louca por causa de uma injúria!
Por que mudei tanto? Porque meu sangue fica numa agitação diabólica com quaisquer duas palavras?”

O morro dos ventos uivantes - Emily Bronte


quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

O ladrão de almas desesperadas


Pra começar meu relato devo dizer que alguns não me consideram um ladrão, pois afinal, ladrão é aquele que rouba um objeto de alguém, pega sem consentimento, então literalmente eu não sou um ladrão, eu sempre peço antes de pegar, e quando as coisas estão perdidas eu me aproprio delas, afinal já dizia o ditado achado não é roubado.
Prefiro justificar minha profissão como algo que traz alivio as pessoas, seria eu um anjo, um demônio ou um xamã muito poderoso, ou quem sabe o melhor amigo que um desesperado pode ter. Mas eles preferem me chamar de ladrão, tudo bem, que assim seja, não vou me abster em nomenclaturas.
Eu vago pela noite de bar em bar, visito hospitais, asilos, orfanatos, casebres, mas engana-se quem pensa que somente nesses lugares existem almas para ser pegas, eu visito palácios, casas familiares com cachorros, gatos e brinquedos, as almas desesperadas por vezes estão nos lugares em que menos esperamos. Está no rosto da menina mais linda, ou da menina mais inteligente, no rosto do garoto popular ou daquele que sempre está contando uma piada pra alegrar o ambiente. E com o passar do tempo às almas desesperadas estão aumentando.
É engraçado isso, achei que com o passar dos séculos as coisas melhorariam, hoje todos têm a sonhada liberdade de expressão, tecnologias avançadas, curas pras doenças, mas penso que os seres humanos estão regredindo, eles estão cada vez mais só, cada vez mais voltados ao próprio umbigo e aos próprios problemas, seres desesperados que procuram abrigo em redes sociais, festas, bens materiais, mas não conseguem estar bem consigo mesmo em apenas 10 segundos de solidão.
É aí que eu entro, cada vez mais jovens em seus 10 segundos de solidão me procuram, gritam meu nome em alto som implorando pra que eu leve sua alma, sua jovem alma que ainda não viveu nada, mas que acarreta um peso tão grande em si mesmo que ele prefere viver sem ela, mesmo que isso traga sérias consequências como não conseguir mais sentir nada. E eles não querem sentir, eles só querem viver, viver mecanicamente suas vidas sem um sentimento de alegria, paz, tristeza ou amor. E eu vendo muitas vezes esses jovens cheios de vida implorando pra que eu leve suas almas me compadeço de sua tristeza, e digo que o verdadeiro alivio pras seus corações está dentro de si mesmo, não fora, mas eles não ouvem, e isso é um mal desse novo século, ninguém mais ouve um conselho, ninguém mais ouve um amigo, ninguém mais ouve a si mesmo, seus corações não falam mais, todos têm suas próprias crenças e ilusões do que significa a vida, e não precisam mais ouvir nada. Crianças tolas, eu penso, suspiro, tiro o baú de dentro do casaco preto e em um minuto a alma está guardado dentro dele, deixo o jovem dormindo em sua cama e amanha tudo estará bem, ele pensará que foi um sonho e seu cérebro o guiará para o melhor caminho, e algum dia quem sabe, quando ele quiser ouvir seu coração perceberá que é tarde demais, pois um coração não fala sem uma alma.
Minha vida se resume nisso, eu roubo almas, não roubo, mas as guardo, são meus tesouros, pessoas colecionam livros, figurinhas, latinhas, brinquedos...eu coleciono almas. Não sei quando isso começou, talvez quando eu era bem jovem, não me lembro, só me lembro que desde que minha primeira alma foi conquistada eu não mais envelheci, nem uma ruga, nem um cabelo branco, acho que elas me fortalecem, ou quem sabe, exista mesmo alguma força superior que precisa de mim nesse trabalho, não sei.  Nunca tive o desejo da vida eterna, como eu disse no começo, às vezes me vejo como um anjo ou um demônio, dando as pessoas exatamente o que elas querem, mas no fundo do meu coração eu sinto compaixão por elas, sinto por vê-las assim, mas sinto também que não posso fazer nada, são as escolhas que movem o mundo, elas fizeram as delas e eu faço as minhas. É assim que deve ser.
Durante a noite o trabalho é mais pesado, quase não tenho tempo pra descansar, mas quando o dia nasce poucas almas se desesperam. A maioria volta à rotina de trabalho, estudo, estudo, trabalho, e eu, bem eu vou ver o nascer do sol. Gosto do nascer e do por do sol, gosto de vê-lo cada dia de um lugar diferente, um dia prefiro vê-lo nascendo no mar, outro dia se pondo nas montanhas, um dia gosto de vê-lo nascendo em meio às areias do deserto e se pondo entre a neve branca. Acho que isso é um dos maiores prazeres do meu trabalho, posso me locomover com o pensamento, isso e os livros. Durante séculos aprendi o grande mundo mágico dos livros, e eles são meus companheiros nos dias de solidão que se seguem sem fim.
Às vezes penso que vou ficar desesperado com essa vida que levo, aí me pergunto, se eu ficar desesperado quem virá roubar minha alma, quem virá pra ficar no meu lugar? Mas me acalmo em seguida, é só fechar os olhos e conversar com meu coração, ele sempre me dá as respostas que preciso, e sempre me conforta nas horas em que me sinto alterar.
Algum dia quem sabe eu consiga me aposentar, acredito que falta pouco pra pílula anti-desespero ser inventada, ou uma injeção com validade de um ano que inibe seus sentimentos, ou uma pastilha com o seu gosto favorito que deixa feliz por 24h...quem sabe!
Bom pra terminar, eu gostaria de deixar um conselho, quem sabe um conselho escrito alcance mais pessoas e elas entendam o sentido daquilo que sempre lhes falo:
Escute mais seu coração, converse mais, viva intensamente cada momento, veja o nascer e o por do sol, seja amigo e seja verdadeiro, observe o instante mágico dos dias, observe a vida que segue e que cada dia se extingue um pouco mais, suas vidas são como ampulhetas, a areia não para de descer e o tempo não para de correr, não deixe pra perceber o real sentido das coisas quando a areia estiver quase no fim. Mas se mesmo assim, ainda não conseguir ficar 10 segundos consigo mesmo, olhando dentro de você e se encarando no espelho, me chame, basta gritar meu nome em alto som que eu apareço pra levar sua alma, pois na realidade eu acredito que você não é merecedor dela.

Atenciosamente.

O ladrão de almas desesperadas.


segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013


O portão balançava, fazendo o seu barulho de sempre, lá fora gotas grossas de chuva caiam insistentemente, ela estava sentada na janela e observava os pingos deslizaram pelo vidro, pensava sobre o mundo e sobre as coisas que existiam nele.
Não gostava de dias assim, cinzas e frios, eram dias solitários em que não se podia brincar no quintal, nem balançar nos galhos das árvores, dias em que não se podia andar descalço e tomar sorvete... Dias que não passavam e tudo a deixava entediada.
Os dedos frios desenhavam figuras na janela embaçada, um sol sorrindo, montanhas, pipas no céu... e pensava que o mundo poderia ser como um desenho seu, colorido, quente e feliz.
De repente se assustou com o barulho do portão que bateu com força na parede e lá ficou. O vento aumentou e trouxe um arrepio. Ela desceu da beirada da janela pra pegar um casaco e escutou um barulho estranho no guarda roupa, algo estava se mexendo lá dentro. Parou por uns instantes com medo de ser um rato ou o Bicho Papão, pegou um travesseiro e segurando-o como se fosse à arma mais letal do mundo abriu com força a porta.
Lá dentro seu mundo mudou e ela percebeu que a chuva não podia durar para sempre...
E assim aconteceu.


“ E as coisas que começaram a acontecer a partir daquele momento eram tão lindas e grandiosas que não consigo descrevê-las. Para nós, este é o fim de todas as histórias, e podemos dizer, com absoluta certeza, que todos viveram felizes para sempre.”

TRECHOSA ÚLTIMA BATALHA - AS CRONICAS DE NARNIA
C. S. LEWIS


terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Nada Contra - Aline Valek


“Não tenho nada contra homofóbicos. Eu, inclusive, tenho muitos amigos que são. O problema é que tem uns homofóbicos escandalosos, que não conseguem ser discretos. Ficam dando pinta que não gostam de gay, sabe? Tudo bem ser uma pessoa rancorosa e preconceituosa, mas não em público. Entre quatro paredes e bem longe de mim, tudo bem. Nada contra mesmo.
É impressionante o quanto eles se acham no direito de ficar com pouca vergonha na frente de todo mundo. Outro dia ouvi um cara dizer, em plena luz do dia e para quem quisesse ouvir, que “gay é abusado, mexe com homem na rua mais do que homem mexe com mulher”. Acredita? Mas já vi e ouvi coisas piores. “Tenho nojo de homem se pegando” ou “essas menininhas que se beijam não são bissexuais coisa nenhuma, só querem chamar atenção dos homens” ou ainda “te sento a vara, moleque baitola”, e por aí vai. E se alguém critica, logo apelam para “ah, foi só uma piada” ou “é a minha liberdade de expressão” ou ainda “está na Bíblia”. O horror, o horror.
Ser homofóbico é uma opção, mas ninguém tem a obrigação de aceitar, né. É muito constrangedor ver alguém olhando feio para duas pessoas do mesmo sexo se beijando. Como eu vou explicar para os meus filhos que existe gente intolerante? O pior é que nem na escola as crianças estão a salvo. Querem ensinar nossos filhos a serem homofóbicos, imagina! Quando você percebe, já é tarde demais: uma amiga minha foi chamada pela diretora porque o filho foi pego espancando um colega no intervalo. Tudo porque o rapaz era gay. Minha amiga, coitada, não aguentou a decepção de ter um filho homofóbico. Ela diz que é só uma fase, que vai passar. Por garantia, levou o menino no psicólogo.
Acredite, homofobia tem cura. Soube de uns casos de conversão que parecem até milagre. Em um dia, a pessoa estava lá, odiando gays, militando contra o direito dos homossexuais ao casamento civil, fazendo marcha pela família e tudo o mais. Mas com um pouquinho de empatia e bom senso, eles começaram a ver que não tinham nada que se meter com a sexualidade dos outros. E como o respeito é todo-poderoso e misericordioso, os ex-homofóbicos viram que os gays eram boas pessoas e também mereciam os mesmos direitos. Hoje dão testemunho de tolerância.
Agora, tão preocupante quanto homofóbicos exibidos e sem-vergonha são aqueles que não se assumem. Aqueles que não saem do armário, que se fazem de pessoas normais e sem ódio no coração, mas que, no fundo, no fundo, também são fiscais de cu alheio. Pensa comigo: você sai com uma pessoa dessas, sem saber da opção de ignorância dela, e começam a pensar que você também é homofóbico, igual a ela. E todos sabemos que homofóbicos são abominações, ninguém quer ser confundido com um deles. Além disso, onde enfiar a cara quando eles resolverem se revelar e soltarem um “odeio viado” assim, do nada?
Mas não me leve a mal. Não tenho nada contra os homofóbicos, apenas não concordo com a homofobia. Essa doença quase sempre vem acompanhada de outros preconceitos, como o machismo e o racismo. É um caminho sem volta. Fico triste de ver tantos jovens se perdendo nesse mundão de ódio gratuito. É por essas e outras que prefiro ter um filho gay a um filho homofóbico. Ah, você quer saber se eu vou aceitar e amar um filho que virar homofóbico? Como alguém já disse por aí, eles não vão correr esse risco; vão ser muito bem educados.”




“_ Quando a gente morre_ diz a mulher de cabelo escuro da mesa ao lado_ agora podem transformar a gente em diamante. É cientifico. É assim que eu quero ser lembrada. Quero brilhar.”




Páginas de um diário encontrado numa caixa de sapatos abandonada num ônibus da Greyhound em algum lugar entre Tulsa, Oklahoma , e Louisville, Kentucky. – Neil Gaiman

domingo, 6 de janeiro de 2013

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013



“Pessoas se despedaçam tão facilmente...
Sonhos e corações também...”

Coisas Frágeis II – Neil Gaiman

quarta-feira, 2 de janeiro de 2013


"Acho que o mundo vai acabar em preto e branco, igual a um filme antigo.
(Cabelo preto como carvão, amor, pele branca como a neve.)...
Talvez enquanto haja cores, consigamos sobreviver.
(Lábios vermelhos como sangue, procuro sempre me lembrar.)”

Páginas de um diário encontrado numa caixa de sapatos abandonada num ônibus da Greyhound em algum lugar entre Tulsa, Oklahoma , e Louisville, Kentucky – Neil Gaiman