quinta-feira, 12 de maio de 2011

Veraneando

"Ao poucos criei comigo, cultivei mesmo sem querer, certa impassibilidade. Totalmente impassível, sabe?
Assim uma sombra… que nada procura.
Nem lembro quanto tempo faz, criei um estado escuro, pouco úmido a minha volta.
Nele me faço ou me cuido enquanto estou doente, só fico, que é meio preguiçoso nele. Tento me salvar, vezes que penso que a febre não vai passar e o inerte dos membros vão permanecer, desvairado até coloco desvario no pensamento de que o sol vai correr, vai sair do lugar, vai pra frente, vai pra trás, não terá sempre sombra e não será preguiçoso sempre aqui e pensar que não será preguiçoso sempre me inquieta, então tento correr pra fora do estado, levanto-me com os pés e com as mãos, mexo rápido as pernas pra me tirar daqui correndo, mas é úmido, escorrego, perco o chão, fico no ar um pouco espasmódico e! é, caio um pouco desengonçado, meio dentro de um ridículo.
Penso as vezes que tá tudo bem, que não depende de mim ir pro sol e que talvez ele, o sol, é quem escolhe pra quem nasce. E é aí, nesse instante exato em que começo a pensar, que encontro um socorro – usando essas palavras assim tão dramáticas, se bem que drama lembra tragédia e tragédia me lembra as satíricas em que se chora nela toda pra rir no fim ou o contrário, não lembro bem, mas vê -, encontro um socorro. Por um momento fecho os olhos e me esforço, me esforço de verdade como numa jaula humana onde sua unica grade ou comogol está alta demais e num esforço fico na ponta do pé pra sentir o sol na cabeça que assim é mais fácil pensar certas coisas.
E eu penso em você e quando eu penso em você eu pego um momento e não importa a data e não importa que horas são nem se é noite ou dia útil e nem menos pouco importa se é tarde lenta de domingo ou uma segunda fodida de muito trabalho sobre a mesa, porque quando eu penso em você eu sinto na minha cara uma passagem como de estação e se o sol não cobre por completo essa cara seca e rasgada coloco nela um pensamento de sombra de folha de outono que amarela e seca voa numa brisa vindo de sei lá donde, se do Olimpo ou de algo bonito, e o vento frio de inverno vem e por um momento uma nuvem que como uma esponja absorve o sol da minha dor, aparece pra sumi-la e é nesse momento que escorre sangue e a armadura enferruja e cede sobre meu corpo criando frestas por onde preguiça começa a se esgueirar por dentro de mim como ursos e musaranhos e ouriços e esquilos e marmotas e morcegos querendo hibernar ou hibernar-me, mas eu penso em uma força, e penso que é minha essa força, e coloco toda em você ou no pensamento meu de você a fim de criar uma luz clara e grossa e iluminar com essa luz clara e grossa alguma coisa que já é ou está ficando escura e me enchendo de sabe-se bem o quê. Então e só então que desesperado penso primaveras, eu penso equinócios primaveris com muita força e faço o equinócio passar pra que os dias sejam mais longos e as noites mais curtas e é quando eu chego ou o meu pensamento chega a você! Meio esforçado chega, e você ou tu – e penso até um nós - refloresces como um toque de um tateio e uma luz de uma sombra igual uma morte de uma vida e vezes uma vida de uma morte e então quando isso acontece eu já estou perdido entre a primavera e o verão e o que saiu do meu pensamento de ti – e me perdoe te chamar já assim de ti mas estou tão perdido e é tão bom – e o que refloresceu do meu pensamento de ti são coisas inenarráveis ou inomináveis ou tudo junto não sei, mas parece que Deus deixa de estar morto e varre e sopra pra longe tudo junto como umidades-folhas-nuvens-preguiças-etcs e então chove uma chuva totalmente enxuta porque agora irremediavelmente meu pensamento toca você…


…e a verdade é que quando eu penso em você eu pego um momento e não importa a data nem as horas nem quando porque quando eu penso em você é sempre Verão"

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