Ela abraçava forte o livro contra o peito. A tarde já estava indo embora
e o vento frio de outono brincava com seus cabelos trançados. Ela caminhava
silenciosa sobre as folhas amarelas caídas das arvores. O cenário lhe dava
nostalgia.
Há sempre um dedo de poesia nas tarde de outono, ela sentia isso quando
caminhava por ali. Existe um pouco de tristeza escondida nas folhas mortas, nos
troncos das arvores se preparando pra mais um inverno rigoroso, nas pessoas
escondidas do vento, talvez somente seu coração se sentisse assim, talvez por
isso se sentisse só, ninguém compartilhava com ela a harmonia de uma tarde de
outono.
Apertou mais forte o livro contra o peito. Gostaria de estar dentro dele
naquele momento. Ali poderia ser a princesa dragão, a rainha traída, a Mãe, a
Donzela, O guerreiro, poderia ser a espada da manhã, o guardião da muralha, o
corvo dos três olhos, poderia ser o que quisesse desde que vivesse dentro
daquele livro. Poderia tentar lê-lo em voz alta, quem sabe tivesse o dom de se
transportar para dentro da história. Talvez...
Gostava das tardes de outono, mas sentia falta de algo, parecia não
fazer parte daquele cenário, como uma figura pintada no quadro errado. Como um
personagem perdido no conto que não lhe pertencia.
Dobrou uma esquina e escutou o apito de um trem. A estação estava perto
dali.
A alguns outonos atrás gostava de ficar sentada na estação criando histórias
pra cada pessoa que ali passava, sobre suas viagens, seus segredos, em sua
imaginação alguns deles eram detetives disfarçados atrás de um grande mistério,
alguma mãe indo se encontrar com o filho perdido... suspirou.
_ Eu poderia ser uma história...
E com esse pensamento dobrou os quarteirões caminhando contra o vento, parou em
frente ao guichê de passagens.
_ Uma passagem, por favor.
_ Para onde senhorita?
Tirou os trocados do bolso.
_ Pra onde eu possa pagar.
O vendedor a encarou por uns minutos, sorriu com o canto dos lábios.
_ Suponho que seja apenas de ida. Seu trem sai nesse exato momento. Deve
se apressar.
Ele entregou sua passagem e o dinheiro que ela havia lhe dado. Diante do
seu olhar questionador. Ele disse:
_ Rápido doce Alice, não vai querer perder seu trem, sua história
começará sem você se isso acontecer.
Ela guardou o dinheiro agradeceu e correu pela estação embarcando em um
trem qualquer.
Sentou-se na janela, abriu seu caderno de colégio, arrancou as fórmulas
de matemática, a história de seus antepassados, as conjunções adverbiais de
tempo e lugar, não ia mais precisar de matérias escolares, era ela quem faria, a
partir de agora, suas fórmulas, suas histórias, seus pronomes, pegou sua caneta
especial e começou:
“Em uma nostálgica tarde de outono ela se lembrou de quem era, se
agarrou aos seus sonhos e percebeu que seu caminho deveria ser outro. Juntou sua
coragem e seu livro embarcando em um trem que um estranho lhe indicou...”
“Para que servem os anjos?
A felicidade mora aqui comigo
Até segunda ordem...”
A felicidade mora aqui comigo
Até segunda ordem...”
Legião Urbana
Acho que não tenho nada legal pra comentar. Mas gostei muito.
ResponderExcluirMuito mesmo, esse texto ficou intenso.