O ar de outono invade meu quarto, olho pela janela e percebo que o dia está naquele momento sagrado, em que a sua luz cede espaço para as trevas da noite chegar. Para os índios, é o simbolismo de um amor eterno entre o deus Sol e a deusa Lua.
As cores da tarde vão se despedindo de mim, fecho os olhos e respiro o ar frio que está chegando. Sinto o outono dentro de mim e me lembro daquela frase “Outono é uma estação da alma”. Suspiro. Meu suspiro ecoa pelos bosques da minha alma.
Caminho pra fora da casa, entro no jardim de rosas, meus passos são passos leves de uma sonhadora, meu olhar percorre aquele campo cercado pelas últimas luzes do dia. Sento-me ao pé da arvore e começo a acariciar o vento, uma leve brisa gelada me entorpece, espero a primeira estrela nascer cheia de esperanças para pedir que o sonho se realize.
Tudo é tão solitário e o frio desta brisa que costuma vir no outono me faz sentir nostalgia, o sinto tocar-me os braços querendo aquecer, sem perceber que com aquilo me congela ainda mais, os dedos do vento me fazem sentir calafrios, um sopro da morte em meu pescoço.
A primeira estrela nasce, faço um rápido pedido e percebo outra ao seu lado, serão seus olhos brilhando pra mim? O vento brinca com meus cabelos e os pássaros e os bichos do jardim começam a silenciar com a noite que chega.
Na vida real a que pertenço não sinto mais suas mãos me tocar, nem seu beijo me acalentar a noite, o beijo mortal na madrugada fria, o beijo da culpa e do desejo, mas do amor eterno que nos une.
Aproveitaria eu a noite e romperia a escuridão dos bosques que nos separam, as amarras de vida e morte que insistem em nos prender longe e correria até você, com os passos lentos de uma sonhadora. Te encontraria e com um beijo cálido molharia sua face pálida, olharia em seus olhos escuros de cobiça pelo sangue que corre em minhas veias e me entregaria. Você sentiria o pulsar do meu coração, porém eu jamais escutaria o seu bater com meus tímpanos de pobre mortal. Jamais escutarei seu coração batendo como os sinos solitários do templo em que moras.
São nesses dias de outono que penso se seria feliz ao seu lado, poderíamos flutuar até as estrelas meu bem amado, voar pelas atmosferas do pensamento e nada mais. A natureza humana nos daria adeus, nossas memórias enfraqueceriam pelo tempo e nada mais restaria de nós, além de nossa sede e nosso amor.
Uma coruja pia, e eu acordo de meu transe, procuro me esquecer de todas as dores que me causa, dos pesadelos e dos medos, porém perdoe-me querido se não consigo, seu olhar oculto ainda está vivo nas paredes do meu quarto e quando a lua aparece me sinto angustiada pois é nela que vejo seu rosto, mas tenho que me conformar com o destino, o guardião da minha escuridão já partiu.
Neste surrado e cansado coração está à despedida em silêncio de uma jovem perdida de amor, e que a morte sele meus lábios com ele dentro de mim, porém esse outono eu levarei comigo para o além morte.
A noite caiu completamente a minha volta, como uma mãe que acolhe a filha ela abriu seus braços e acolheu minha dor. Levanto-me, é hora de ir.
A noite vai entoando minhas preces, sinto tão perto de mim aquelas mãos frias que me embalavam numa sutil dança de amor e sedução.
Continuo caminhando entre as rosas rumo a casa e essas paisagens tão nostálgicas me mantém presa dentro de mim mesma.
Eu própria me encarcerei, encarcerei minha dor e busquei o caminho que estou seguindo agora, no meu destino apenas angustia e solidão.
Eu sou um pássaro de luz que me aventurei a cair nas trevas e fui enclausurada. Sou um pássaro trancado na gaiola da noite, meu canto não é mais bonito e minhas penas perderam o brilho.
Chego a porta da casa e olho para a escuridão que me rodeia. Uma noite quem sabe, eu encontrarei você aqui na entrada e dividirás comigo todo esse caminho.
Uma noite, quem sabe...
Sua sempre.
Nota da Autora: Anastácia é uma personagem de RPG criada por mim há algum tempo. Quem sabe é hora de suas histórias aparecerem por aqui. Com carinho.
Alice